Há uns anos, começámos a ouvir falar em reuniões entre uma elite de clubes europeus tendo em vista o estudo (ou apenas a ameaça) da criação de uma liga privada europeia que viesse instalar uma espécie de NBA do futebol do velho continente. A assustada UEFA e os seus variados amigos mediáticos foram rápidos a assinalar os perigos à integridade da modalidade, e a grasnar as (supostas) ganância e má intenção da ideia em discussão. Nos últimos tempos, os rumores têm andado tímidos embora, provavelmente, a hipótese esteja longe de ser esquecida pelos intervenientes.
Num primeiro momento, senti-me impelido a temer a mudança porque sempre achei que o futebol é um desporto muito especial cujo sucesso e magia sobrevivem num equilibrio muito delicado - o facto de a autoridade máxima da arbitragem internacional ser uma espécie de concelho de anciãos (britânicos), é um indício que existe muito quem concorde que as mudanças na modalidade têm de ser lentas e quase cair de maduras, para não ofender os deuses da bola. Afinal, o que seria do campeonato nacional?
No entando, e aos poucos, fui reparando em sinais que mostram que, de repende ou gradualmente, deveremos avançar para uma mudança estrutural nas competições de clubes europeus. A saber os principais:
- Os campeonatos nacionais são cada vez menos "nacionais" e cada vez mais cosmopolitas (raros serão os casos em que os jogadores autócnes sejam em número superior aos estrangeiros)
- A presença na Liga dos Campeões e na Liga Europa parece ser a principal finalidade dos melhores clubes durante a participação nas competições nacionais;
- Em todos os campeonatos vão surgindo anualmente vários casos de clubes que não têm sustentabilidade económica para disputar a principal liga nacional;
- O calendário futebolistico está sobrecarregado, devido sobretudo à ineficiência de várias competições no que toca à geração de receitas.
Em Portugal, creio que qualquer um destes sintomas é ainda mais grave do que na média. Por isso mesmo, considero que devemos estar na linha da frente da reflexão quanto ao novo caminho das competições de futebol, a começar por levantar a hipótese de uma Liga Ibérica. Isso mesmo. Compreendo que a primeira reacção de muitos seja de vómito, até a minha é, mas convido-os a deixarem o sabor a bilis sair da boca e dedicar pelo menos alguns minutos a pensar no assunto.
Por muito que tenha um temperamento romântico no que toca ao futebol, acho que preferia ver semanalmente jogos do Benfica com Ibrahimovic, Villa, Simão, Rossi, Hulk, Liedson, etc, do que com Devic, Sougou, Élvis e Alonzo.
No estado actual de coisas, acabamos por ter um campeonato português, sim, mas com poucos portugueses, fraca qualidade, e em que a maior competição gira em torno da sobrevivência financeira diária e não do real desempenho desportivo. A verdade é que estamos todos a financiar um modelo de entretenimento miserável (mesmo quem não lhe liga nada) e que nunca vai conseguir sustentação nem governação.
Numa penada: quando quero ver o Benfica jogar escolho a Liga Sagres, quando quero ver futebol tenho que sintonizar outros campeonatos e competições europeias.
As ligas desportivas privadas são um pouco chauvinistas, é verdade, mas funcionam. E têm sempre em competição os melhores, e não trocam jogadores por dinheiro como mercadorias. E as nacionais, se são para satisfazer orgulhos de bairro, basta funcionarem a nível semi-profissional.
É darwinismo desportivo. Cruel? Talvez. Saudável? Também.
Liga Ibérica de Futebol? Eu digo sim - mesmo com um aperto no peito.
(Gostava de ter escrito e publicado este post antes do arranque do campeonato, para ter a certeza que o seu conteúdo não será confundido com algum tipo de apreciação à primeira jornada)
5 comentários:
Bom post!
Deixo um conselho de amigo se quiseres ver bom futebol vê o FCPORTO que se assemelha às grandes potências europeias... Vais ver que não custa nada e poderás continuar a ter um temperamento romântico no que toca ao futebol!
Venha a Liga G14.
Epa nunca tinha feitoe ssa reflexão de um modo tão completo.
A liga Sagres não tem viabilidade económica.
Os pequenos clubes apenas morrerão neste ambiente. Sempre existirão em ambiente de bairro. As ligas dos últimos sempre existirão, e ainda bem. E devem até ser acarinhadas (como acontece aqui em Inglaterra, que é comum qualquer pessoa se interessar por essas divisões menores, "que envolvem menos dinheiros e confusões").
Venha a Liga Ibérica.
Nem mais...A nossa liga está podre há anos...E um dos sinais é certamente o facto de os clubes grandes não contratarem quase ninguém de clubes nacionais. As camadas jovens são mal aproveitadas. De que serve ver um FCP-Paços? o FCP não ganhou é certo, mas o jogo valeu alguma coisa?nem por isso...Será que um FCP-Barcelona seria de melhor qualidade? talvez, mas traria mais interesse...
E que tal o Benfica nessa II Divisão Ibérica, sem nunca mais ser campeão de nada. Visão entusiasmante?
Mais uma vez se revela aqui alguém que acima de tudo é anti-benfiquista, sem dúvida o segundo maior clube em Portugal... a nível de adeptos é claro!
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