26.7.09

Os media portugueses e o Futebol

Começo com as boas-vindas a todos e o agradecimento devido por me ter sido permitido participar num fórum com dois sportinguistas eruditos, dois portistas que em tempos faziam uma dupla ofensiva fut-5 com garra e entendimento de envergonhar um liedson+derlei e um futuro dirigente do meu Benfica que nos empurrou a todos para isto. Prometo que a generalidade dos posts terá dimensões mais adequadas para um blog (mais curtos portanto).

Uma das coisas que sempre gostei mais nos futebol é o facto de qualquer pessoa poder falar, exaltar-se, discutir, pragejar, gritar-com-os-amigos, chorar, sobre um assunto que, ao fim e ao cabo, não é assim tão importante. Um verdadeiro ginásio de emoções, um excelente escape para a nossa (normalmente frustrada) necessidade diária de tomar partido e acabar de um lado ou do outro de uma vitória. Mesmo um Francisco Louçã, que negava a Paulo Portas o direito de debater o aborto por ausência de filhos, ou algum snob futebolístico, sentirá que, no que toca ao desporto-rei, todos têm direito de emitir o seu juizo nem que seja para o descrever como “vinte e dois homens a correr atrás de uma bola”.

No entanto, se o achismo é interessante no café e entre amigos, a sua continuidade nos espaços ditos especializados em futebol dos media torna-se recorrentemente irritante. O pretenso esforço informativo e até formativo dos meios de comunicação social parece estar negligente para com a modalidade desportiva favorita do país.
Entre o clássico dom da imprensa escrita para encher chouriços, com cada vez mais gordura e menos carne e tempero, e a absoluta banalidade dos painéis de debate e análise da televisão, a rádio parece escapar-se um pouco melhor ao especializar-se na diária da notícia directa e nas injecções de adrenalina ao fim-de-semana – o online segue a imprensa escrita e ainda não conseguiu usar da melhor forma as suas ferramentas.

Não se trata aqui de atacar o trabalho do jornalista desportivo. Sinceramente, não sei o que faria no lugar do redactor ou editor de diário desportivo. Emparedados entre a dificuldade de encontrar assunto todos os dias em todos os clubes e a pressão comercial de concretizar títulos de capa com um ou mais dos 3 grandes (Benfica em particular), os talentos da profissão acabam por se confundir com os medíocres por simples ausência de “espaço editorial” que permita vislumbrar a diferença.

O problema parece estar na indisponibilidade, desinteresse ou incapacidade dos decisores em apostar na qualidade e promover a modalidade, que é enfim o problema. Fechado nesta rotina de banalidade e discurso circular, o futebol descobre-se muitas vezes limitado como assunto às arbitragens e ao 4x4x2 em losângulo vs 4x3x3 aberto (como se estas conjugações de três algarismos fossem a ocupação a tempo inteiro dos treinadores).

É importante evoluir o discurso e pôr o foco no que realmente de mágico acontece naqueles largos metros quadrados de relva. Não é preciso ir agarrar no dicionário ou em livros de filosofia e ganhar erudição. Basta falar futebol. Basta, por exemplo, saber que um jogador “ter técnica” não significa grande coisa porque esta, ao contrário do que é normalmente assumido, não se limita ao drible e ao passe redondo – é por isso que se insiste em desvalorizar o futebolista inglês que, por norma e pelo menos, tem melhor técnica de remate (quer com pés quer com cabeça) e cabeceamento (tanto passe como corte como finalização) do que o português. Basta que a Sic Noticias não continue a dar palco semanal a um comentador que usa, como sustentação do argumento que algum clube esteve mal nas contratações, notas que ele próprio atribuiu a cada um dos jogadores (?!?!?!). Basta que o director do Record não agradeça (em coluna publicada) a Quique Flores, na altura em que a coisa corria bem, por validar com vitórias (a posteriori portanto) a intenção a priori e irredutível do jornal em sobre-valorizar o desempenho do Benfica. Basta que se faça (apesar de tardiamente) como a Sportv e se retire espaço a um Joaquim Rita que insiste em usar vocabulário um pouco mais evoluído (reconheça-se) mas permanente num contexto em que não faz jus ao seu sentido.

Matava-os falarem um pouco mais dos bons jogadores que há nas outras 13 equipas da Liga Sagres e 16 da Liga Vitalis? Seria assim tão escabroso distinguir entre um tipo de técnica de outro para melhor se distinguir um jogador de outro? Seria um chocante momento descoberta-do-homem-atrás-do-feiticeiro-de-oz caso um dos comentadores ex-futebolista nos fosse dando vestígios da sua experiência, mesmo que apenas no genérico, quanto a o que se passa em certos momentos entre as quatro linhas e outros entre quatro paredes?

Duas notas finais:
1 – Reconheço as claras melhorias da mudança do futebol nacional de volta para a RTP. Obrigado Domingo Desportivo, não nos deixem nunca mais.
2 – Se é para abandalhar, que seja para abandalhar a sério. Noutras palavras, volte os Donos do Jogo, nem que seja em episódios repetidos. Acho que aí até encontravam um papel realmente digno do Rui Santos.

6 comentários:

Cisto disse...

Bernardo,

epa ora aqui está uma reflexão valorável, do tipo que espero ver mais vezes neste blog, e não me parece nada que seja um texto demasiado longo.
Subescrevo o que aqui dizes, Bernardo, e pergunto-me por que raio quando vemos um jogo de andebol ou hoquei ou até mesmo futsal pela televisão, ouvimos os comentadores a pronunciarem-se nas questões técnicas e tácticas com lógica e atenção e revelando conhecimento profundo sobre os jogadores e treinadores e no futebol nada disso acontece? Por que é que no futebol se concluiu que é razoável meter no ar qualquer indivíduo, seja jornalista, cirurgião ou cineasta, que mande uns bitaites? A verdade é que a coisa como está torna igualzinho ser um jornalista a comentar ou um trolha, na grande maioria das vezes. A diferença encontrar-se-á apenas no nível da arrogância, da certeza absoluta com que revestem as tolices que bradam.
A título de exemplo, sublinho a certeza absoluta com que todos - todos! - os jornalistas analisam os fora-de-jogos, ignorando (ou parecendo ignorar) a regra do em caso de dúvida beneficia-se quem ataca.

Bernardo ON disse...

Raúl, a questão que levantas em relação aos comentários das outras modalidades é crítica. Realmente, é assombrosa a diferença de discurso e especialização entre o que acontece no futebol e em praticamente todos os outros desportos.
Na base destas diferenças parece estar a distorção da tal democratização da conversa de bola. É difícil compreender que os media confundam "toda a gente poder falar do assunto" com "toda a gente perceber do assunto".

Bobe disse...

Isto é um problema grave de marketing do produto futebol português. Todos os intervenientes à sua maneira conseguem ir matando o futebol. Mas isso acho que serve de matéria para mais um post.
Concentrando-nos nos media, apercebemo-nos que ninguém se preocupa verdadeiramente em vender com qualidade o produto.
Penso que em Inglaterra a FA faz os programas e vende-os. Como tal sendo a própria liga acabam por valorizar o produto no seu todo, todos os clubes, todos os jogadores.
Em Portugal, a tv compra os direitos apenas para poder passar um jogos de um dos 3 grandes por semana. e de resto, os outros programas, regra geral, servem apenas para aumentar as suspeitas de corrupção e a intriga.
Raul, a mim faz-me mais confusão em relação aos foras-de-jogo que é algo que não é relativo, ou é ou não é, os comentadores não se conseguirem comprometer e utilizarem chavões como "parece que pode estar em posição legal", "difícil de descortinar se se encontra em posição irregular". Acho que não tem mal nenhum dizerem se está ou não e de qualquer forma ressalvarem a questão de que o arbitro em caso de dúvida, beneficia quem ataca.
Bernardo, excelente post, do género do que se pretende para este blog. Numa altura em que existem inúmeros blogs desportivos e até podemos comentar notícias em jornais desportivos, fizemos este blog com este sentido, o tentar ser diferente. Quando quisermos ser mais do mesmo, podemos sempre utilizar os meios que mencionei atrás para nos expressarmos.

PC Jr. disse...

a solução era termos menos programas a falar sobre nada.

O Sr. Primeiro Ministro deveria proibir a edição de jornais desportivos diários, passando a uma periodicidade bi-semanal.

Portugal precisa do Benfica campeão!

Cisto disse...

eheh

frederico disse...

O jornalismo desportivo nacional claramente necessita de dar uma volta. Ou faz como os italianos e mete miudas giras e jeitosas a apresentar ou então que deixe de apostar em jogadores de futebol falhados que apenas dizem mais do mesmo, movimentos de ruptura, etc... Tragam o Gabriel Alves de volta.Já!